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GRÉCIA FAZ HISTÓRIA AO APRESENTAR PRIMEIRO PERSONAGEM INTERSEXO NA TELEVISÃO

 

Grécia faz história ao apresentar primeiro personagem intersexo na televisão

(A bandeira intersexo é composta pelas cores amarelo e roxo — escolhidas de forma intencional para evitar associações com géneros tradicionais e historicamente ligadas à identidade intersexo.)

Publicado originalmente por Tovima.com em inglês. Tradução e adaptação para português pela equipa da DHIA

A série Serres, do argumentista grego Giorgos Kapoutzidis, fez história ao apresentar o primeiro personagem intersexo na televisão do país, numa iniciativa que marca um avanço inédito na visibilidade e representação desta população.

Uma bandeira de inclusão

A bandeira intersexo, composta pelas cores amarelo e roxo, foi concebida para evitar associações com géneros tradicionais e é hoje símbolo internacional da identidade intersexo.

Inovação num panorama televisivo conservador

Num setor em que muitas vezes a audiência é priorizada face à qualidade e inovação, Serres destacou-se não pelo orçamento de produção, mas pela coragem de abordar temas até agora silenciados na televisão grega.

Aclamada pela crítica, a série escrita, apresentada e protagonizada por Giorgos Kapoutzidis marcou também a primeira vez em que se ouviu a palavra “intersexo” na televisão do país — uma passagem que gerou milhares de reações e discussões nas redes sociais e órgãos de comunicação.

Uma voz pela mudança

Kapoutzidis é reconhecido como uma das vozes mais influentes da televisão grega contemporânea. Em entrevista ao jornal To Vima, declarou:

“O objetivo do meu trabalho é sempre inspirar as pessoas a seguirem numa direção melhor. As minhas histórias são escritas com amor e bondade — e, para mim, a bondade é a maior virtude humana.

Serres, inspirada na vila natal do autor no norte da Grécia, é o seu projecto mais pessoal até agora.

Descoberta e empatia: Tia Stamatina revela-se intersexo

Na segunda temporada, acompanhamos Odysseas, um jovem afastado do pai, que após a morte da mãe regressa à terra natal. No oitavo episódio, o público descobre, juntamente com a família, que tia Stamatina é intersexo — uma verdade que esteve escondida durante seis décadas.

Numa cena emotiva, o médico explica que “as pessoas intersexo nascem com características sexuais variadas. Ela foi criada como mulher, mas a sua anatomia não é exclusivamente feminina nem masculina — trata-se da anatomia de uma pessoa intersexo. Infelizmente, nunca lhe disseram, e vocês tampouco sabiam.”

A personagem, interpretada por Giouli Tsagaraki, ajuda a desmistificar o tema, mostrando que as variações intersexo são parte natural da diversidade humana.

Mais adiante, Stamatina ouve pela primeira vez a sigla LGBTQI, introduzindo um momento didático em que cada letra é explicada de modo sensível e carinhoso — mostrando o poder da televisão enquanto ferramenta de empatia.

Reação da comunidade e impacto social

A cena foi celebrada publicamente pela organização Intersex Greece, coletivo nacional que defende direitos das pessoas intersexo e suas famílias:

“A Comunidade Intersexo da Grécia manifesta o seu profundo agradecimento ao criador Giorgos Kapoutzidis pela decisão de incluir uma personagem intersexo na segunda temporada de Serres — revelando, no oitavo episódio, que a tia Stamatina, já querida pelo público, é uma mulher intersexo. Esta é a primeira vez que o termo ‘intersexo’ é oficialmente usado numa produção televisiva grega — um facto de enorme importância histórica para a visibilidade intersexo no nosso país.”

A organização destacou também o comentário subtil, feito através da revelação médica, sobre a tendência mundial para a medicalização dos corpos intersexo — reforçando que tais variações são perfeitamente naturais.

A declaração conclui:
“Um obrigado caloroso a toda a equipa e, em especial, à atriz Giouli Tsagaraki. Já amávamos a tia Stamatina, mas agora temos ainda mais motivos para a amar.”

Mais direitos e visibilidade

Em julho de 2022, após longo diálogo com o Ministério da Saúde, a Grécia tornou-se o quinto país do mundo e o quarto da União Europeia a proibir mutilações e procedimentos “normalizadores” em bebés e crianças intersexo. Esta conquista estabelece o direito à integridade corporal e representa um importante passo para garantir o bem-estar e o desenvolvimento livre das crianças intersexo, reconhecendo que os Direitos Intersexo são Direitos Humanos.

Serres, ao apresentar esta narrativa inovadora e sensível, dá um pequeno mas significativo passo rumo à visibilidade, dignidade e reconhecimento das pessoas intersexo em toda a sociedade grega e internacional.


 Fonte:

Matéria publicada originalmente em inglês em Tovima.com: https://www.tovima.com/culture/greece-introduces-first-intersex-character-on-tv-in-historic-milestone/ 

Tradução e adaptação por DHIA para fins de informação, sensibilização e promoção dos direitos intersexo

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